Decidiu grávida ter a filha no espaço. Não num espaço qualquer, mas onde estarão suspensas em lugar nenhum, onde nenhum ponto possa ser visto, nada a contemplar com os olhos. A única coisa que leva, além da filha, é um grão. Nua, se pôs em órbita ao redor de seu ventre cada vez mais agudo. Rompeu a placenta e o cordão umbilical segurou por um tempo uma criança vagando. Não fosse pelo que se sabe do corpo e do que as unia, não saberia identificar na escuridão onde a filha recém nascida poderia estar. Se tocaram pela primeira vez e a mãe ofereceu-lhe o seio. Seio breu, leite breu, fome breu. Durante anos as únicas coisas que pôde conhecer a criança eram os seios e o grão, os únicos pontos do universo, como se no negror do espaço houvesse duas ferpas soltas que não lhe ofereciam risco, uma que a embalava e se movia, outra que era um grão. Cresceu, aprendeu a vagar, as horas eram silenciosas, nenhuma palavra aprendeu, língua nenhuma. Tateando o corpo da mãe e o grão, explorava-os com todos os questionamentos mudos que possam existir, o negrume nada dizia e quanto mais crescia, maiores eram os terrenos do corpo e do grão.
Os olhos inúteis, de repente o negrume do espaço ganha três corpos que ele mesmo não pode ver ou sentir, que se movem, se movem, se arriscam em sonhos todos os tatos, amplificando a presença do grão. Não há dúvida do lugar quando não se sabe o que é um lugar. Ali, únicos, desentendem de espaço, é como se entre os corpos houvesse vagas que são também dos corpos, como se entre um dedo e outro este espaço fosse também parte da mão. É. De tanto que é o que se tem é todo corpo, e não se sabe se o que move são os corpos ou o que existe entre eles. Tudo move e tudo são vagas de um corpo só, então matéria. O grão chegou a ter para a menina as mais variadas dimensões, desde o maior dos astros até a ínfima partícula, aprendeu a não ter limites.
A mãe decide levá-la à terra. O que não se sabe, não se vê. A filha reporta pelo corpo sensações distintas, como o calor ao se aproximar do sol, porém seus olhos ainda são cegos. Que surpresa teve a menina ao tocar os pés na terra e sentir novas sensações como respirar pela primeira vez! Toda êxtase e euforia, viu o grão entrar na paisagem escura e sumir. A mãe o havia plantado. Ali ficaram por dias até que do grão nasceu a muda e a filha pôde ver da absoluta escuridão brotar uma cor que fez abrir a teus olhos o mundo que se revela ainda aos poucos através da cortina.
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